Eu fingi não ser romântica.
Era mais fácil do que me frustrar esperando por algo que não iria acontecer...
Demorou muito pra eu assumir pra mim mesma que sou do time das mulheres românticas. Daquelas que choram com declaração em cartinha, que se derretem por um presente feito à mão, que amam um jantar com vela acesa só pelo gesto, pelo cuidado, pelo detalhe.
Demorou porque, por muito tempo, fui mais leal à personagem que criei do que aos meus próprios sentimentos.
Na minha cabeça, eu deveria ser desapegada. Moderna. Prática. Feminista. A mulher que não liga pra essas bobagens. A que não se abala por não receber flores. A que não espera nada. A que não precisa de provas de amor!!!
Mas essa mulher era uma fantasia. Uma defesa, na verdade, que surgiu depois da primeira cartinha que escrevi pro meu companheiro, lá no início do namoro, 10 anos atrás. Dobrei o papel com carinho, escolhi palavras bonitas, desenhei coraçõezinhos nos cantos como quem diz: estou aqui, inteira. Coloquei num pequeno baú e entreguei. Depois disso, inconscientemente, esperei.
Esperei a cartinha de volta.
Um bilhetinho no guardanapo.
Uma tentativa de romantismo e reciprocidade do meu gesto.
Ela nunca veio.
Teve também a vez em que aprendi a fazer a sobremesa preferida dele. Peguei a receita com a tia, treinei o ponto do creme. Ele comeu emocionado, me agradeceu. Mas nunca fez algo de volta.
E eu fiquei ali, quieta. Recolhendo as flores sem motivo que não vieram, os bilhetes que não chegaram, os gestos que não aconteceram. Tentando me convencer de que era normal. Que o amor verdadeiro é assim mesmo: sem garantias, sem retorno, sem reciprocidade visível. Afinal de contas, amar é sofrer um pouco, né?
E aí começou o ruído. É justamente nesse lugar de silêncio que os mitos do amor romântico & das performances de gênero fazem morada, hoje eu entendo. Eles entram pela fresta da frustração e sussurram:
“Você está exigente demais.”
“Homens amam de outro jeito.”
“Se não tem romantismo, é porque ele é prático.”
“Você que é sensível demais, fala sério.”
“Mas ele te ama, do jeito dele…isso não é suficiente?”
Esses mitos são como roteiros invisíveis que nos ensinam a engolir o que sentimos, a aceitar menos do que precisamos, a não nomear o que nos falta. E quando a gente não nomeia, a gente começa a acreditar que talvez o problema esteja em nós.
Mas, na verdade, o problema real tá nesse script viciado que naturaliza o sofrimento como prova de amor. Que nos diz que amar é se doar até o fim, até sumir, sem querer nada de volta. Que reforça a ideia de que cuidado é coisa de mulher, e que esperar reciprocidade é coisa de gente carente.
O que descobri, aos poucos e com um tanto de humildade, é que querer ser amada com gesto, com presença, com intenção não é futilidade. Não tem nada de bobo em desejar ser vista…é disso que a gente precisa, mesmo, por mais vergonhoso que seja (e não é!).
Não é humilhante desejar ser tocada por um amor que se expressa também nos detalhes, nos pequenos rituais de afeto…mesmo em um relacionamento com um homem!
E, na verdade, pensando aqui enquanto escrevo, embora pareça singelo, ser romântica é profundamente político.
Reivindicar o direito de ser romântica, num mundo que deslegitima o desejo feminino, é também reescrever a prática do amor fora da lógica da dor, da espera e do silêncio solitário reservado às mulheres historicamente.
Reivindicar e se reconectar com o nosso romantismo tira o amor desse lugar de sacrifício, de adivinhação do desejo, e leva a gente pro lugar da escolha, da construção de estar junto.
Às vezes, tudo o que a gente quer é uma cartinha de volta.
E tudo bem querer, sabe?
Eis o que descobri depois de anos em análise: tudo isso estava só na minha cabeça.
Eu esperei em silêncio, assim como aprendi ao longo da vida, e continuei sem aquilo que eu precisava.
Eu achava de verdade que deveria ser natural, que perderia a graça/a importância se eu pedisse por um gesto de carinho.
Até que um dia… eu pedi.
Pedi com vulnerabilidade. Com vergonha, até. Com medo de parecer frágil ou carente.
Mas pedi. E, pasmem, ele atendeu.
Ele não fazia ideia do quanto isso era importante pra mim.
Ele simplesmente não foi ENSINADO a demonstrar afeto da mesma forma que eu (e pra ele, tava tudo bem!)
E TUDO mudou na nossa relação.
Meu namorado, hoje marido, começou a ser mais carinhoso. A me dar pequenos presentes ou enviar uma mensagem fofinha quando lembrava de mim no meio do dia. A escrever bilhetes tímidos, mas sinceros. Começou a transformar o afeto em gesto porque EU ditei as regras do que eu precisava na nossa relação.
Não dava pra eu culpar ele e me ressentir em silêncio.
O amor que eu queria precisava ser dito em voz alta.
E eu descobri que dizer o que a gente precisa — ao contrário do que me ensinaram —
não mata o romance.
Dizer em voz alta é o que dá espaço pro outro de fato atender e entender a importância pra gente…e isso não depende do gênero, digam o que for!
Eis a ideia revolucionária do romantismo:::: Homem pode até não ter aprendido, não ter sido socializado dessa forma…mas no momento em que está em um relacionamento com uma mulher que precisa de algo diferente…esse homem pode muito bem começar a aprender o que-como-quando fazer, viu?
Um viva a nós, mulheres românticas, que não aceitam viver num relacionamento sem demonstração de afeto ✨✨✨
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Texto lindo e tocante