Amor na prática, mas muito além disso.
Pra qualquer relacionamento dar certo, a gente precisa ter um oooutro olhar pras nossas diferenças.
Há um evento canônico na vida de muitas mulheres que marca o início de uma jornada de autoconhecimento e transformação nos relacionamentos: a leitura de "Tudo Sobre o Amor", da bell hooks. Já leu? Se não leu, recomendo fortemente (tem em PDF gratuitamente, só dar um google!). Esse livro, que tem ganhado ainda mais relevância em tempos de discussões importantíssimas sobre como a gente se relaciona, nos ensina que o amor não é apenas um sentimento romântico e etéreo. O amor é, acima de tudo, uma prática ativa de respeito e libertação.
E por que isso é revolucionário? Porque bell hooks nos lembra que o amor não é óbvio nem acessível a todos em um mundo marcado por opressões estruturais. Em um contexto onde a violência, a manipulação emocional e a negligência ainda são práticas comuns em muitos relacionamentos, o amor verdadeiro se torna um ato político.
Ele exige que repensemos como nos relacionamos, não apenas com os outros, mas também com nós mesmos.
Inclusive, no ano passado, organizamos um grupo de estudos sobre a trilogia do amor da bell hooks – "Tudo Sobre o Amor", "Salvação" e "Comunhão" –, e foi incrível ver como essas obras ressoam com as questões que enfrentamos hoje. Desde a busca por relacionamentos mais saudáveis até a luta por um mundo mais justo, a mensagem de hooks é clara: o amor só existe quando é praticado.
O amor só existe quando é praticado.
E é aqui que entra outra pensadora essencial: Patricia Hill Collins. Em "Black Feminist Thought", ela nos ensina que o amor, como prática diária, deve ser fundamentado no reconhecimento e no respeito pelas complexidades das identidades de quem amamos.
Isso quer dizer que, quando falamos que o amor é uma prática diária, estamos falando das pequenas revoluções de pensamento que acontecem no dia a dia. O amor se manifesta nas pequenas-grandes ações: na forma como escutamos, como validamos as emoções do outro e como nos esforçamos para entender perspectivas diferentes da nossa.
Por que to te falando tudo isso?
Primeiro porque tenho repensado a forma como eu trabalho-estudo-penso sobre amor, e cada vez mais penso em formas melhores da gente amar e estar junto, aceitando nossas diferenças - e acho que isso é importante.
No ano passado, eu me dediquei a trazer mais reflexões sobre a nossa própria forma de comunicar aquilo que a gente precisa (relacionamentos positivos precisam de comunicação positiva, etc). Esse ano, to achando e sentindo que a gente precisa de mais ferramenta, de mais conhecimento prático sobre os nossos próprios relacionamentos: o quanto a gente repete padrões e discussões que tão aí no mundo, na sociedade, sem nem perceber?
Aqui entre nós: nesse ano, quero bater mais na tecla de como cada pessoa carrega uma série de identidades que moldam sua experiência no mundo: gênero, raça, classe social, orientação sexual, habilidades, geração, entre outras. Essas identidades não existem isoladamente; elas se interseccionam e criam realidades únicas para cada indivíduo, que afetam diretamente cada relacionamento.
E também porque tenho visto muito que váaaarios dos conflitos que recebo frequentemente na clínica de casal tem a ver com exatamente isso: a diferença de experiências no mundo + a invisibilização de algumas questões que tem a ver com gênero/raça/classe/identidade, não com o casal em si.
São questões que fazem com que as mulheres precisem (supostamente) falar mais e mais alto, puxando brigas repetidamente que, na maioria das vezes, não são entendidas e, portanto, mantém um cenário onde suas necessidades ficam ali de canto, sem serem atendidas.
Por exemplo, um dos conflitos mais comuns que vejo no consultório envolve a divisão desigual de tarefas domésticas. Muitas vezes, a mulher se sente sobrecarregada, acumulando responsabilidades dentro de casa, enquanto seu parceiro(a) parece não perceber a quantidade de trabalho que ela está assumindo. Essa situação não é apenas uma questão de tarefas domésticas, mas de reconhecimento das desigualdades e expectativas de gênero (que a mulher dê conta da casa sozinha, alou década de 1950!) - e é isso que temos que trabalhar em sessão, não só ajustando a divisão de tarefas simplesmente! - percebe?
Daí, o que que ta em jogo quando surge um caso clínico no consultório onde o assunto é “tarefa doméstica”? Um monte de coisas pra além da divisão certinha de quem faz o que.
Temos uma mulher que sente que está sozinha, frustrada porque o parceiro se recusa a dividir as tarefas de casa de forma justa. Ela sente que o apoio emocional e a participação nas responsabilidades do lar estão desequilibrados, o que leva a discussões sobre falta de colaboração e empatia.
Isso é paliativo, o nosso trabalho na clínica precisa ir muito além, mas clicando aqui você consegue baixar uma lista de tarefas pra ajudar nesse processo, se for o seu caso! :)
No final das contas, relacionamento é político, sempre. E o amor como prática diária é um caminho transformador - e a bell realmente tem razão em afirmar isso tão categoricamente. Amar na prática nos desafia a olhar para o outro em sua totalidade, reconhecendo e respeitando suas complexidades.
Essa jornada não é sempre fácil, mas é profundamente recompensadora - e é isso que eu desejo pra mim e pra você que tá me lendo até agora, mesmo com esse papo mais cabeça! rs
Faz sentido pra você? Me conta :)
Um beijo e até a próxima,
Carol Padilha.
Ps.: mês que vem tem lançamento do meu novo curso, que chama “Pare de brigar!”. Especialmente para casais e pessoas que querem se relacionar melhor - e a gente vai fundo no que que provoca brigas pros casais em relacionamentos hoje. Em breve trago mais infosss <3 aguardem!